
COMUNICALCS
A VOZ ATIVA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS – UFSC

2ª EDIÇÃO
O Jornal Estudantil do Centro Acadêmico Livre de Ciências Sociais | UFSC
NOVEMBRO/2019
COMUNICALCS
A voz ativa das Ciências Sociais

MARCHA DA CONSCIÊNCIA NEGRA
Um convite à resistência – Página 2
NOTÍCIAS
Fique por dentro do que já foi realizado pelo CALCS e o que ainda está por vir! – Página 3
COLUNA ESTUDANTIL
Arte e Política em debate – Página 4
Editorial
NA ATUALIDADE DO RACISMO BRASILEIRO, QUAIS AS POSSIBILIDADES PARA O POVO NEGRO?
⠀⠀⠀⠀Esse texto parte do que consideramos o essencial. Atualmente, temos por certo que não existe capitalismo sem racismo, considerar verdadeira essa afirmação implica conceber a luta antirracista como essencialmente anticapitalista!
⠀⠀⠀⠀O Brasil se criou no genocídio e na escravidão dos povos ameríndios e dos negros africanos sequestrados do além-mar. Após o fim da exploração escravista, que se deu apenas na dimensão legal, com a assinatura da lei Áurea, absolutamente nada foi feito para reparar os índios que tiveram suas terras roubadas e seu povo dizimado, e os negros que, em mais de 300 anos feito escravos, foram impedidos de adquirirem terras, acessar o mercado de trabalho e o ensino público. Passados muitos anos e episódios políticos importantes, desembocamos no Brasil de hoje, e, a realidade que não se pode fugir é que, seja nas colônias, na monarquia ou na república, os negros não tiveram vez.
⠀⠀⠀⠀Tivemos um recente período de reformas que, embora necessárias, se revelaram incapazes de criar uma sociedade de iguais. Com a virada no ciclo político, vimos ruir o projeto que buscava conciliar “um olhar social” junto dos interesses do mercado financeiro nacional e internacional.
⠀⠀⠀⠀A grande maioria das reformas ‘foram para o espaço’, e a extrema-direita põe em curso não apenas pacotes de reformas neoliberais, mas um projeto de reorganização do Estado, para aprofundar ainda mais a exploração.
⠀⠀⠀⠀O que os negros tem a ver com isso? Tudo! Passaram-se os anos, mudou-se o regime e aos negros ainda resta a violência, o não-lugar e a exclusão. Isso não é dizer que dentro do regime democrático-burguês não é possível fazer nada, mas que a despeito de avanços pontuais, as estruturas continuam as mesmas, e a estrutura capitalista necessita do racismo, como arma ideológica, para seguir a plenos pulmões. Necessita que para além da primeira camada de exploração, digamos assim, haja uma massa gigantesca de pessoas consideradas de segunda categoria em trabalhos mais precarizados possíveis, indivíduos-alvo para a violência genocida do Estado, passíveis de serem jogadas nas cadeias, e em condições inferiores aos brancos em todas as esferas do mundo do trabalho e da vida social.
⠀⠀⠀⠀Objetivamente, falar em transformação das estruturas do capitalismo é muito vago, esse objetivo a alcançar leva o nome de socialismo.
Imagem por: Isadora Daurizio (@colagemruim)
⠀⠀⠀⠀Pensar nesse sentido implica ver a saída coletiva como o meio mais coerente frente à individual, é acreditar que pautar um modo de reprodução da vida que se baseie na igualdade dos seres humanos, indistintamente, continua sendo uma possibilidade real e urgente.
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⠀⠀⠀⠀Longe de ser um ideal teórico estagnado, a construção do novo mundo é um esforço prático. Temos em nossa história uma longa lista de heróis e heroínas, que doaram sua vida pela derrubada da exploração e por um país mais justo. Não se deve ter dúvidas que Marielle Franco é uma delas. Mulher negra, mãe, lésbica, favelada (como ela mesma fazia questão de se denominar) e socialista, tão potente em sua conduta revolucionária que em seu primeiro mandato foi covardemente assassinada pelo Estado neofascista brasileiro.
⠀⠀⠀⠀Não apenas porque investigava a intervenção federal no Rio de Janeiro ou porque sua dissertação de mestrado denunciava a atuação das UPP’s* dentro das favelas, mas porque, por ser quem era, acreditar no que acreditava e atuar como atuava, representava às muitas comunidades, do Rio e de todo o país, um sopro de esperança na carcomida política brasileira. Representava tudo o que o estado não deseja, que é, o povo, negro, oriundo da pobreza, maioria em número no país, tomando a posição de protagonismo e rejeitando o "lugar" a que sempre foi submetido.
A realidade do capitalismo do século XXI é complexa demais para que a respondamos de maneira simplista, mas por certo temos que o povo negro já esperou demais que cesse o genocídio ou o bom senso da não exploração. Temos todo o potencial revolucionário transformador em mãos, que nos falta?
*Unidade de Polícia Pacificadora
Novembro de 2019

Centro Acadêmico Livre de Ciências Sociais – UFSC
E por aqui…
⠀⠀⠀⠀Ao contrário do que se tem no imaginário popular nacional, no sul do país é real a presença do povo negro, bem como sua notoriedade nas mais diversas áreas. Em Florianópolis, Antonieta de Barros, jornalista, professora e primeira deputada estadual do país e primeira deputada mulher do estado de Santa Catarina, bem como Cruz e Souza, poeta também nascido na ilha em 1861 são exemplos da representatividade que evidentemente foi por séculos apagada devido a forte influência portuguesa, italiana e especialmente alemã no estado. A Marcha da Consciência Negra, que estará nas ruas do centro no dia 23 de novembro, sábado, tem por objetivo resgatar e celebrar essas figuras de grande importância para a comunidade
e, bem como denunciar a negligência do estado frente a aspectos como a saúde da população negra, direitos político-sociais, contra a intolerância religiosa, racismo e violências sofridas pelas mulheres negras e os LGBTQI+. Mais que isso, a Marcha vem para mostrar a nossa força e resistência mesmo ante do projeto de extermínio que vem sendo executado desde o período colonial. Por nenhum direito à menos!
O QUE: Marcha da Consciência Negra.
QUANDO: Sábado, 23 de Novembro de 2019 à partir das 10h.
ONDE: Concentração na Escadaria do Rosário, Centro de Florianópolis.

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Horário das Reuniões do CALCS:
Segunda-Feira às 20h | Quinta-Feira às 10h
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NOTÍCIAS
Fique por dentro das notícias do CALCS!
Mesa de debate sobre Identidade, Raça e Gênero é primeiro evento de formação da gestão
⠀⠀⠀⠀No dia 23 de setembro, o CALCS organizou uma mesa de debates com o tema: Identidade, Raça e Gênero em uma perspectiva classista, que aconteceu no mini-auditório as 19h de uma quarta-feira. O evento teve como convidadas: A professora de Letras-Inglês da UFSC e membro do NETrans, Ti Ochoa, a estudante de design e militante do Coletivo Negro Minervino de Oliveira, Alicia Costa, e a estudante do curso de biologia e militante do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, Rebeca da Rocha. Foi um evento cheio, com estudantes de diversos cursos, no qual foi debatido com muita qualidade e descontração, com várias participações e intervenções, esses temas tão fundamentais, mas que infelizmente não encontram muitos espaços dentro da sala de aula. Resistiremos!
Junto ao CALPSI planeja-se um HH
⠀⠀⠀⠀Na tentativa de promover um evento para descontração, os Centros Acadêmicos de Ciências Sociais e Psicologia estão organizando um Happy Hour com data prevista para o dia 06 de dezembro, a fim de amenizar um pouco o estresse do fim de semestre e proporcionar uma integração social maior entre os estudantes. Para a realização da festa, estão sendo realizadas reuniões de planejamento entre os CA's. Preparem seus copos!
Última resolução do conselho universitário
⠀⠀⠀⠀Aprovada no dia 5/11 a resolução 132, possibilitou novas alterações no calendário acadêmico, que beneficiam as, os e es grevistas. Escutando as reivindicações de estudantes, foi decidido por uma ampliação de data até o dia 14/11 para o cancelamento de disciplinas e trancamento de matrícula. Junto a isso, foram abertos novos períodos para a digitação das notas, que se estendem até dia 3 de março. Foi orientado aos estudantes procurarem seus centros acadêmicos para esclarecimento de atualização do calendário acadêmico do curso.
CALCS participa do debate sobre o regimento eleitoral do DCE
⠀⠀⠀⠀Depois de consultas e debates entre o Diretório Central dos Estudantes - DCE e os centros acadêmicos, via Conselho de Entidades de Base - CEB, a eleição foi adiada para o início do próximo semestre, para que seja massificada e qualitativa. A votação, a principio, aconteceria dia 15/12, mas, tendo em vista a questão das adaptações do calendário acadêmico pós-greve, estima-se que muitos alunos já não estarão em período de aula pra participar da votação. Na continuidade dos CEB, se inicia o debate sobre o regimento eleitoral na procura de adequá-lo; os destaques foram mandados pelos estudantes, e a avaliação do mesmo continua junto aos centros acadêmicos.
CALCS realiza Brechó para a arrecadação de fundos
⠀⠀⠀⠀Com o objetivo de operacionalizar a entrada de valor no caixa do CALCS, a comissão de finanças organizou um Brechó. As roupas foram coletadas ao longo de algumas semanas, e as vendas iniciaram na quarta – feira dia 20/11, na feirinha da UFSC. Está sob avaliação a realização de mais eventos como este. Fique atento/a as redes sociais do CALCS.
Gincana de Integração dos alunos de Ciências Sociais
⠀⠀⠀⠀Em um trabalho conjunto de todas as comissões do CALCS , está sendo organizada uma gincana com a finalidade de integrar os aluno do curso com atividades e ambientes diferentes da nossa rotina acadêmica. Essa atividade surgiu pela enorme carência que foi deixada nas primeiras relações entre calouros e a universidade por conta do período de greve. Assim, esta é uma tentativa de promover uma aproximação dos espaços do campus junto a debates proeminentes, tendo como método atividades mais práticas e esportivas. Fiquem ligados nas atualizações, deve acontecer no dia 30/11.
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Coluna Estudantil
Esse espaço está reservado para textos, fotos, charges e outros meios que comuniquem a opinião estudantil.
Precisava ir
⠀⠀⠀⠀Precisava ir. Sentou-se na cama, tocou a última canção que lhe lembrava algo, e, enquanto o último acorde do velho violão amarelo ainda cortava a imensidão do quarto escuro, levantou-se. Precisava ir. Jogou fora sua coleção de pétalas secas guardadas dentro dos livros empoeirados, jamais lidos. Queimou o restante de suas inutilidades e deu adeus à fumaça de certezas que deixava o seu quarto pela janela. Deixou que a água lavasse toda a coragem que ele guardava intacta a tanto tempo. Secou-a com calma e sorrindo disse, com tom quase maternal: precisamos ir. Havia tido um sonho estranho naquela noite, rostos iluminados flutuavam na imensidão negra, alguns lhe diriam que fora visitado pelos deuses, mas como não era nada hermético, classificou aquilo tudo como alucinação desorientada disfarçada de surrealismo barato. Precisava ir. Queria enxergar a montanha grisalha caminhando em sua direção ao fim do asfalto seco. Ansiava por acordar em meio a noite fria para urinar aos pés de uma árvore centenária iluminada pela luz de estrelas mortas. Prometia a si mesmo que sentiria seus olhos queimando pelo vento frio que corre no deserto noturnal. Esperava ver de perto o monumento de Mitad del Mundo, enquanto o sol médio lhe rasgava a cara. Precisava ir. Balançou a cabeça para os lados como quem nega as linhas traçadas já escritas que para ele não existem e jurou, a partir de agora, escrevê-las da maneira mais profunda possível, como um martelo que sangra a carne. Se abaixou para verificar se debaixo da cama não havia nenhum sentimento esquecido, concluiu que não. Olhou pela última vez para as paredes amareladas que abraçavam os seus pensamentos mais intensos e sorriu para elas com a alegria de quem recorda dos amigos mais distantes e das melhores histórias vividas com cada um deles. Sabia que a linguagem era simplesmente uma série de símbolos cômpares e se perguntou: como iria transmitir aos outros o infinito? Foi então que decidiu se levantar e dizer em voz alta: “Preciso ir!”. Após uma breve pausa, ele desorientado então percebeu: que já tinha ido havia muito tempo e, portanto, já não precisava de mais nada.
Bruno Viegas – 8ª fase de Ciências Sociais | UFSC

Comissão – Comunicalcs:
Editorial: Matheus Menezes & Sandriane Silva
Notícias: Nathalya Rodrigues
Colunas: João Vitor Salvan
Diagramação: Cristiano Kerber, Eduardo Grotmann & João Vitor Salvan

Espelho

Imagem por: @inquietar, 20 anos – 3ª fase do curso de Ciências Sociais | UFSC
E se praticarmos Gramsci...
⠀⠀⠀⠀Desde 2016 temos observado um processo de perseguição e exoneração a funcionários públicos ligados a esquerda. Nas palavras da direita, isso é "desaparelhar o Estado". Atento a isso, percebi que grande parte do campo progressista se institucionalizou, fragilizando os vínculos com as bases sociais. Os intelectuais orgânicos, de que fala Gramsci, tornaram-se mais intelectuais que orgânicos. Para todos nós esse fenômeno é bastante traumático, principalmente, porque encerrada por um golpe a experiência de centro-esquerda a frente do poder, percebeu-se que a "base" que estava nos discursos, não existia com a mesma força na realidade. Cidades historicamente 'petistas', por exemplo, radicalizaram a direita. Não sei se esse processo é sempre consciente, mas ele pode no mínimo ser menos dramático. Diferente da acusação feita a nós, nunca se colocou Gramsci em prática, um dos maiores escritores marxistas do século XX. Esquecemos que a luta de classes, acirrada no Brasil pela ruptura do modelo conciliatório, não se manifesta apenas na disputa pelo governo, como explica Gramsci, mas estes conflitos, visíveis ou não, estão nas igrejas, nas associações de bairro, nas feiras, nas escolas, na mídia, e até na vida afetiva. Nós estamos nestes espaços? Muito pouco e quase sempre calados. O 'outro lado' tem feito o dever de casa - criando seus partidos, estéticas e redes -, enquanto muitos de nós está esperando a próxima oportunidade de fazer campanha presidencial. No mínimo, ingênuo. A hegemonia é um processo diário, da qual depende o sucesso de todas as transformações econômicas e políticas que queremos para o Brasil. O primeiro passo são as sinceras autocríticas acompanhadas de proposições contundentes em todos os espaços.
Cristiano Kerber – 5ª fase de Ciências Sociais | UFSC
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